‘Se a pós-graduação está em perigo, o futuro está em perigo’, diz Sandra Goulart
Reitora da UFMG debateu o financiamento da pós no Brasil em encontro promovido pela SBPC
O fomento à pós-graduação brasileira deixou de acompanhar seu grande crescimento nos últimos anos, lembrou na tarde de hoje a reitora da UFMG, Sandra Goulart Almeida. “Precisamos insistir em um modelo de financiamento sustentável e sustentado, por meio da Capes e outras agências, o que nos possibilitará planejar a gestão da pós. A instabilidade na alocação de recursos tem impacto negativo nos programas e na produção científica no Brasil. Se a pós-graduação está em perigo, o futuro está em perigo”, afirmou.
Sandra participou de um dos painéis do Dia em Defesa da Pós-graduação, iniciativa da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), ao lado do reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA), Emmanuel Tourinho, e de deputados integrantes da Comissão de Educação da Câmara. A mediação foi da vice-presidente da SBPC, Fernanda Sobral.
A reitora destacou que a pós-graduação é responsável por grande parte da produção de conhecimento novo no Brasil e que o país é internacionalmente respeitado pela robustez de seu sistema, construído como política de Estado, e pela transformação dessa qualidade em cooperação solidária com outros países.
“Financiar adequadamente a pós-graduação é viabilizar a produção científica, a capacitação de recursos humanos de alto nível e a formação inicial e continuada de professores”, enfatizou Sandra Goulart Almeida. Segundo ela, as universidades públicas têm vivido “aos soluços”, à mercê de medidas legislativas e soluções provisórias. “O esforço que isso exige poderia ser direcionado de outra forma”, acrescentou.
Para a reitora da UFMG, a grande redução em bolsas de pesquisa, tanto na quantidade como nos valores, faz diminuir também o interesse na carreira científica e eleva os índices de evasão de pesquisadores de ponta para outros países. Esse fenômeno, ela salienta, afeta também a internacionalização da ciência brasileira e gera perda da soberania nacional. “A Capes, que tem sofrido cortes significativos de orçamento, deve continuar a ser tratada como instituição de Estado, para que se preserve seu protagonismo no cenário da sociedade do conhecimento”, defendeu Sandra Goulart. Ela também pregou a união de entidades como a SBPC, a Andifes, a Associação Nacional de Pós-Graduação (ANPG) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) na defesa, por exemplo, da retomada do sistema de avaliação da Capes.
Sistema recente e vulnerável
“Nossa pós-graduação tem papel fundamental para assegurar a capacidade do Brasil de enfrentar problemas graves”, ressaltou o reitor da UFPA, Emmanuel Tourinho. Ele lembrou que dois terços dos programas de pós-graduação no país foram criados já neste século. “O sistema é recente, e impressiona como em tão pouco tempo os programas se tornaram sólidos, competitivos. Nossos egressos são cobiçados pelos melhores laboratórios das instituições estrangeiras”, afirmou. “Mas, porque é recente, o sistema é vulnerável a cortes tão profundos.”
Tourinho realçou que a comunidade acadêmica foi protagonista da construção da pós-graduação brasileira e que “isso está se perdendo”. Segundo ele, “é urgente proteger o sistema de avaliação da Capes. A situação de agora gera insegurança, desmobilização de esforços e desconfiança sobre as regras”, disse.
‘Prontos para a pressão’
O deputado Ivan Valente (PSOL-RJ) afirmou que os “ataques brutais” à ciência e à educação e o “desabamento” do financiamento se inserem num processo “de desconstrução do Estado e de desfazimento do arcabouço constitucional”. Ele destacou, no entanto, que “há resistência, e ela é mais que necessária para a construção de uma sociedade soberana e democrática”.
Rogério Correa, deputado federal pelo PT mineiro, reforçou a posição de Valente: “contra o desmanche contínuo tem que haver resistência contínua”. Ele assegurou que parlamentares estão “atentos e prontos para fazer pressão” para que a educação volte a ser prioridade no Brasil.
A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) chamou de dramática a situação nas universidades federais. Citou a falta de recursos para custeio e as dificuldades enfrentadas no laboratórios, que funcionam, muitas vezes, graças à boa vontade dos pesquisadores. “Precisamos fazer mais manifestações e reuniões e lutar para que o orçamento da União tenha o perfil que a pauta unificada da educação e da ciência indicar.”
Lídice da Mata (PSB-BA) ressaltou a necessidade de avançar na defesa da ciência “para que possamos prosseguir na tarefa da retomada do desenvolvimento econômico e social”. Ela recordou derrotas e vitórias da minoria na Câmara e no Senado e garantiu que os parlamentares estão prontos para “levantar a bandeira da educação pública, gratuita, inclusiva e de qualidade”.
Os debates do Dia em Defesa da Pós-graduação ficarão disponíveis no canal da SBPC no YouTube.