A exclusão política das mulheres no Brasil
As mulheres constituem, hoje, 51,7% da população brasileira. Elas correspondem a 44% das pessoas filiadas a partidos políticos no Brasil. Todavia, nossa representação nos parlamentos brasileiros é de apenas 10 a 15%, indicadores inferiores aos registrados em países como Afeganistão, Emirados Árabes e Arábia Saudita.
As mulheres brasileiras vêm, ao longo de anos a fio, promovendo mudanças radicais de maneira praticamente silenciosa, mas efetiva. Elas pararam de ter muitos filhos e passaram a estudar mais, decisões eficazes para transformar padrões de patriarcalismo e racismo coloniais. Em qualquer campo que olhemos, as conquistas das mulheres brancas e negras são uma verdadeira “revolução silenciosa”, que, no entanto, ainda não está concluída.
Em várias partes do mundo, inclusive, há evidências preocupantes de retrocesso em questões de gênero e na situação da mulher. Segundo relatório do Fórum Econômico Mundial, de 2017, a paridade entre homens e mulheres diminuiu em todo o mundo e, ainda mais, no Brasil, cujo cenário é alarmante: o país despencou 11 posições em apenas um ano e está em 90º lugar. No ranking mundial de mulheres parlamentares, o Brasil caiu do 116º lugar para o 151º lugar em um universo de 193 países, tornando-se um “exemplo negativo”. Em 2017, a média mundial de mulheres parlamentares foi de 23,5%. Nas Américas, estamos atrás de todos os demais países, à exceção de Belize e do Haiti.
Costumo afirmar enfaticamente que a democracia representativa ainda se faz em boa parte do mundo e também aqui no Brasil na ausência e na exclusão das mulheres. Além do mais, as mulheres políticas também têm de enfrentar o desafio de desconstruir os lugares socialmente legitimados para seu trabalho, deslocando-se de uma atuação pautada exclusivamente em questões específicas dos grupos vulneráveis.
Alguns argumentos nas pesquisas internacionais nos socorrem para justificar a demanda por maior inserção política das mulheres: (1) com maiores porcentagens de representação feminina, o respeito e o reconhecimento social e político pelas mulheres também aumentariam; (2) a instituição política, por sua vez, teria mais e maior legitimidade perante os representantes das comunidades; (3) a identidade feminina não precisaria estar somente associada à esfera privada/doméstica como espaço de atuação legítima, mas poderia, finalmente, articular-se no espaço público de forma substantiva e não periférica; (4) existiriam, efetivamente, contribuições particulares que as mulheres poderiam trazer para diversificar e enriquecer a política.
As mulheres brasileiras precisam ocupar o poder no Brasil para, definitivamente, reinventar, por completo, a nossa tradição política; construir, na realidade e em bases efetivamente sólidas, o Estado laico, que objetiva o bem viver, um Estado pluralizado, heterogêneo, que faça valer a justiça social, econômica e política. Pense sobre isso nas próximas eleições. Uma reestruturação democrática no Brasil será feminista e antirracista, ou não será.
Marlise Matos: professora do Departamento de Ciência Política da UFMG e coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem) e do Centro do Interesse Feminista e de Gênero