Institucional

'Distanciamento é a única forma de combater a pandemia', reiteram pesquisadores da UFMG

Atuação e propostas da Universidade foram discutidas em painel virtual que integrou a programação da Marcha pela Ciência

Flávio
Flávio Fonseca (no canto alto direito da tela) traçou um panorama da crise epidemiológicaReprodução

Não existe hoje nenhum tratamento para o Covid-19 que seja considerado eficaz pela comunidade científica internacional. Ao mesmo tempo, as vacinas contra o Sars-CoV-2, vírus que provoca a doença, só poderão começar a ser desenvolvidas pela indústria em cerca de um ano e meio – e isso na melhor das hipóteses, já que o tempo médio de desenvolvimento de vacinas é de cerca de cinco anos. Por fim, a hipótese de se alcançar a chamada “imunização de rebanho” (situação em que se alcança um número suficiente de pessoas imunizadas para que a doença não siga avançando exponencialmente) vai se mostrando matematicamente improvável, em razão de fatores como o alto índice de transmissibilidade do novo coronavírus e sua possível recorrência em um mesmo paciente.

"O distanciamento social é hoje a única ferramenta de que as sociedades dispõem para combater a pandemia", resumiu o professor Flávio Guimarães da Fonseca, do Departamento de Microbiologia do ICB e coordenador do curso de Pós-graduação em Microbiologia da Universidade. Sua fala foi reiterada por todos os pesquisadores que participaram na tarde desta quinta-feira, 7, do painel virtual Fique em casa com a ciência e com a UFMG: mobilizações da Universidade para o enfrentamento da Covid-19, que integra a programação da Marcha Nacional pela Ciência, promovida pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada no decorrer do dia.

O painel foi coordenado pela reitora Sandra Regina Goulart Almeida, que destacou a importância dos diálogos que têm sido mantidos com o poder público nas esferas municipal e estadual para o enfrentamento da atual crise sanitária. “Sabemos que o caminho para sair dessa situação passa necessariamente pela ciência e temos consciência do papel da UFMG nesse contexto. Ao mesmo tempo, sabemos que não podemos esperar que outros façam por nós as pesquisas que são necessárias”, disse ela, referindo-se à concorrência mundial que haverá por vacinas. “Isso tem a ver com a soberania nacional. Não se constrói um país sem investimento sustentável e sustentado em ciência”, reafirmou, lembrando, em contrapartida, os contingenciamentos de recursos que as universidades brasileiras sofreram nos últimos anos, sejam os diretos ou aqueles aportados pelas agências de fomento.

Sandra
Sandra Goulart Almeida: soberania nacionalReprodução

Novo normal
Além de Flávio Guimarães e Sandra Almeida, participaram da atividade Hugo da Gama Cerqueira, professor e diretor da Faculdade de Ciências Econômicas (Face) – cujos pesquisadores têm produzido inúmeros estudos relativos aos aspectos econômicos, sociais e demográficos da pandemia – e Cristina Gonçalves Alvim, professora da Faculdade de Medicina que coordena o Comitê Permanente de Acompanhamento das Ações de Prevenção e Enfrentamento do Novo Coronavírus da UFMG. No encontro, Cristina detalhou o trabalho do comitê de apoiar e fomentar as ações que estão sendo desenvolvidas pela comunidade da UFMG com foco no combate ao novo coronavírus. “O comitê busca integrar, articular, dar visibilidade e potencializar as ações internas e externas de combate à pandemia em nossa cidade, nosso estado e nosso país”, disse.

Segundo Cristina Alvim, tem-se mostrado cada vez mais factível a hipótese de que a pandemia não terá um pico, mas, sim, ondas por vários meses, sem uma efetiva imunização de rebanho. Em razão disso, disse ela, “até que surja uma vacina ou um medicamento, nós teremos de construir um ‘novo normal’”, adaptando nosso modo de viver em comunidade. “Pensar esse novo normal dentro da Universidade vai demandar de nós um esforço muito grande”, lembrou. Citando uma reflexão recente de Paulo Eduardo Evangelista, professor do Departamento de Psicologia da UFMG, ela afirmou: "A pandemia vai passar, mas nós não sairemos dela iguais. Podemos sair aterrorizados ou mais conscientes e responsáveis por nós mesmos e pelos outros ao nosso redor".

Cristina
Cristina Alvim, coordenadora do comitê de enfrentamento do coronavírus: sem pico e em ondasReprodução

Em busca da vacina
Em sua comunicação, Flávio Guimarães explicou que existem hoje cerca de 120 projetos de vacina no mundo, dos quais 60 são pré-clínicos, ou seja, estão na fase de testes em animais, para, em seguida, se forem promissores, avançarem para os testes clínicos em humanos. "Na fase de testes em humanos, sabíamos haver hoje cerca de seis ou sete projetos, e o jornal The New York Times listou recentemente 15 nessa fase”, disse. Contudo, ele alertou, mesmo com a vacina desenvolvida, o mundo terá dificuldades para produzi-la em escala suficiente para atender sete bilhões de pessoas. “Se dependermos de importar a vacina, ficaremos muito tempo na fila”, disse o pesquisador, demarcando a necessidade de o Brasil investir, ele próprio, no desenvolvimento dessa solução.

Hugo da Gama Cerqueira, professor e diretor da Face
Hugo Cerqueira: indústria redirecionada para a saúdeImagem: reprodução

Nesse contexto, Hugo da Gama Cerqueira afirmou a necessidade de o Brasil investir em uma readequação de seu parque produtivo, “redirecionando as plantas das indústrias para o esforço da saúde”. Em resposta a uma pergunta de uma das mais de 300 pessoas que assistiram simultaneamente ao evento virtual, ele indicou que essa seria, inclusive, uma medida com potencial de gerar empregos e movimentar a economia. Hugo Cerqueira frisou que esse redirecionamento tem de ser feito desde já, mesmo antes de se ter encontrado a vacina, porque, de um jeito ou de outro, essa estrutura de produção será necessária.

Por fim, o diretor da Face relembrou que não existe uma escolha entre preservar a saúde ou a economia. “Isso é um falso dilema. Gastos e investimentos em saúde, ao mesmo tempo que ajudam a saúde [no curto prazo], ajudam a salvar a economia [no médio e no longo prazo].” Há algumas semanas, a comunidade de pesquisadores da Face publicou um manifesto em que afirma que as duas dimensões são indissociáveis.

O painel Fique em casa com a ciência e com a UFMG: mobilizações da Universidade para o enfrentamento da Covid-19 foi gravado pela TV Assembleia e será transmitido nesta sexta-feira, 8, a partir das 17h, no domingo, 10, às 8h e às 22h30, e na segunda, 11, a partir das 9h.

Ewerton Martins Ribeiro